terça-feira, 19 de agosto de 2014

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Admiração. Acho que essa seria a melhor palavra pra descrever o sentimento que eu tive logo após ouvir a voz de Catharina. Eu faria o que ela mandasse ali só pra poder continuar ouvi-la falando. 

Algum tempo depois fui saber que anjos tem um poder extremamente persuasivo em seres humanos, ela nao precisava mas mesmo assim pediu:

- E entao, me acompanha?

Claro que eu acompanhava. Catharina era facilmente uma das coisas mais encantadoras que eu já tinha visto na vida. Confesso até hoje ficar surpreso com a beleza dela. 

Como disse, estávamos numa boate alternativa no bairro de Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro, e fomos pro andar de cima afim de fugir de “Mr. Brightside” que o DJ tinha colocado.

Quando chegamos lá eu lembro de ter tentado ser casual sem fazer idéia do que ela queria realmente falar pra mim.

- Eu não sei como começar isso, Pablo...
- “Pablo”?! Espera, já nos conhecemos?

Ela nao respondeu. Minha memória nunca foi muito boa, mas com certeza eu me lembraria daquele rosto. Enquanto tentava lembrar ela se explicou.

- Voce não me conhece, mas eu conheço voce..
- O que voce quer dizer? Temos amigos em comum ou algo assim?
- Pablo, meu nome é Catharina.
- Ok, isso devia me ajudar a lembrar de alguma coisa?
- Não. Mas eu preciso muito da sua ajuda.

Ela viu que eu estava bem confuso e continuou.

- Eu vim até aqui falar com voce porque preciso da sua ajuda.
- Olha Catharina..é Catharina, né? Essa conversa tá muito estranha.
- Eu sei, eu sei... essa não era a melhor escolha de lugar para termos essa conversa, mas eu tinha urgencia em falar com voce. Voce é um dos agentes, e eles sabem disso.

Foi nesse momento que eu tive consciência de que nao conseguiria ir embora mesmo se quisesse. Apesar de nada do que ela estava falando fazer sentido eu continuava ali.

- Tres perguntas: o que é um “agente"? Quem são eles? Voce bebeu alguma coisa, Catharina?
- Eu entendo que isso possa ser muita informação pra voce agora, mas infelizmente não temos tempo. Voce não precisa acreditar em nada do que eu vou falar aqui, no fundo voce já sabe que tem alguma coisa estranha acontecendo.
- Voce quer dizer, alem dessa conversa?
- Experimenta olhar a sua volta, Pablo.

Me virei de volta o salão cheio de desconfiança e fiz o que ela sugeriu. Nada. Jovens bebendo, se beijando, jogando sinuca, dançando…

- Pelo que eu estou procurando, Catharina?
- Ali, perto do bar. Blusa preta, saia azul, cabelos presos e saltos altos.

Foquei atençao numa garota que estava alguns metros a direita, rodeada por três caras que nao tiravam os olhos do decote dela.

- Tudo bem, a menina faz sucesso. Mas ela é bonita, isso não é nenhum crime, Catharina.
- Presta um pouco mais de atençao, Pablo. Por favor, se concentre. 

Tem uma coisa que eu nao contei lá no início. Desde que eu era garoto, e eu nao tenho uma explicação lógica pra isso, as vezes eu tocava numa pessoa e sentia suas emoções. Era como se eu visse a pessoa sem máscaras ou disfarces de personalidade. Sempre me perturbava um pouco quando isso acontecia e eu preferia deixar pra lá do que ficar pensando muito nisso. 

E ali, ao focar toda minha atenção naquela garota no bar, eu senti de novo mas nunca foi tão forte. E eu estava bem longe dela, mesmo assim me acertou como um soco, me desequilibrei e precisei da ajuda de Catharina para não cair.

- Desculpa, acho que escorreguei em alguma coisa.
- Voce sabe que isso não é verdade, Pablo. Voce viu alguma coisa ali, eu sei porque eu também consigo ver.
- O que aquela menina tem?
- Ela nao “tem”, ela é uma aaba chamada Máira.

Quando Catharina pronunciou o nome da garota no bar, mesmo com a musica alta ela imediatamente olhou para nós e deu um sorriso malicioso.

- Aaba?
- Ela é um demonio, Pablo.
- Olha, eu acho que estou perdendo suas metáforas aqui.
- Não são metáforas. Vamos conversar em outro lugar? Fiquei feliz de ter te encontrado antes deles. E sim, eu tenho certeza.
- Certeza?
- A resposta da sua terceira pergunta. Sim, eu tenho certeza que não bebi nada hoje. Vamos, eu vou te levar pra casa.

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